Um dos maiores problemas do país é o seu sistema tributário, complexo e caro. A discussão da reforma tributária no Congresso indica que esse mal está com os dias contados
Por Katherine Rivas
Uma das redes atacadistas filiadas à Associação Brasileira dos Atacadistas de Autosserviço (ABAAS) possui 52 funcionários na área comercial. São profissionais que atuam para gerar receita. Mas há outra área da empresa que tem mais funcionários, a tributária. Ali, são 56 profissionais que não contribuem com um centavo para aumentar as vendas e contribuir para o resultado – mas para pagar impostos de forma correta e acompanhar qualquer mudança na legislação que, se ignorada, renderá pesadas multas. Se o sistema tributário do Brasil fosse mais simples, não precisaria ter uma equipe tão grande para a parte de impostos.
Segundo o relatório Doing Business, do Banco Mundial, uma empresa no Brasil gasta, em média, quase 2 mil horas para o pagamento de impostos.
Talvez o maior problema do ambiente de negócios do Brasil seja sua estrutura tributária. Segundo o relatório Doing Business, do Banco Mundial, uma empresa no Brasil gasta, em média quase 2 mil horas no pagamento de impostos – ante 49 horas em Cingapura, melhor país nesse quesito.
Tanto enrosco reflete um emaranhado de regras e tributos de difícil compreensão. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), nos últimos 30 anos foram criadas cerca de 6 milhões de normas tributárias nas esferas municipais, estaduais e federal – quase 800 por dia útil.
Segundo o IBPT, a aberração custa R$ 65 bilhões às empresas brasileiras por ano. “Essa situação obriga as empresas a investir pelo menos 2% do seu faturamento na área tributária”, diz João Eloi Olenike, presidente executivo do IBPT. “Esse custo impacta diretamente na produtividade da economia.” Corrigir essa situação é fundamental. Não é baixo o número de empresas que escolhem deliberadamente não crescer para não verem a complexidade tributária aumentar ainda mais. Por isso, a proposta de reforma tributária que vem sendo discutida no governo federal e no Congresso é um dos temas mais urgentes do país.
REFORMA
Há 63 tributos no Brasil, que seguem o seguinte modelo: 70% sobre consumo, 25% sobre renda e 5% sobre patrimônio. Para Onofre Alves Batista Junior, doutor em Direito e pós-doutor em Democracia e Direitos Humanos, uma reforma tributária adequada para o Brasil deve incluir dois fatores: a busca pela eficiência tributária, simplificando o número de tributos e obrigações acessórias; e justiça fiscal, com a diminuição da regressividade do sistema, que pune os mais pobres. Onofre acredita na proposta que unifica os tributos sobre consumo (ISS,ICMS, IPI, PIS E COFINS) em um único tributo, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). O IBS seria cobrado em todas as etapas de produção e comercialização, e não cumulativo no crédito financeiro, exceto consumo pessoal. A nova proposta de tributação não deve onerar exportações nem investimentos, mas teria incidência sobre importação. As alíquotas teriam impacto no nível federal, estadual e municipal.
Mudanças no setor
Uma reforma tributária bem-feita é benéfica para o atacarejo. Por participar do debate, a ABAAS criou a Comissão de Mudanças Tributárias. Formada por 10 representantes tributários das redes de atacarejo, a comissão atua na elaboração de medidas que possam melhorar a legislação, sem, contudo, reduzir a arrecadação pública. O grupo também acompanha as pautas federais, estaduais e monitora as mudanças tributárias, ajudando os filiados a seguir as regras.
Carla Hamada, do Assaí, diz que, em razão da elevada complexidade e das mudanças constantes nas regras, os associados se uniram para mitigar conflitos com tributação de estados e municípios. “Temos situações diferentes em todos os estados e não temos acesso a informações unificadas”, diz. “Se uma das nossas empresas quer operar em outro estado, a comissão ajuda no esclarecimento das normas.”
A comissão está enviando recentemente um documento ao secretário de Desestatização e Desinvestimento do Ministério de Economia, Salim Mattar, sugerindo algumas ações para simplificar os tributos na categoria. Além disso, também atuou na criação de uma agenda política para o setor.
A ABAAS criou a Comissão de Mudanças Tributárias que atua na elaboração de medidas que possam melhorar a legislação
Belmiro Gomes, do Assaí, diz que a complexidade do sistema tributário está na duplicidade de informações e a dificuldade de acompanhar as mudanças de alíquota nos estados. Uma nova carta enviada ao Ministério de Economia deve sugerir a redução de operações, assim como uma planilha de dados tributários para cada produto. “Queremos simplificação e informações fornecidas pelo Fisco para nos ajudar a não errar”, diz Belmiro. São mudanças que, se forem efetivadas, beneficiam não só o atacarejo, mas todo o setor produtivo brasileiro.
As propostas da ABAAS
Propostas de simplificação tributária da entidade
• Eliminação da obrigatoriedade de entrega de GIA e SINTEGRA, uma vez que as informações contidas nesses documentos já constam da EFD-ICMS/IPI
• Eliminação das informações exigidas, em duplicidade, tanto na ECF quanto na EFD
• Uniformização da EFD, uma vez que, atualmente, há distinções entre os estados e entre as regras de entrega
• Uniformização da Nota Fiscal Eletrônica de Serviço (NFSe), com a criação de um padrão nacional, e das demais obrigações acessórias referentes ao ISS. Tais alterações constam do Projeto de Lei do Senado nº 497/2017, atualmente arquivado
• Uniformização do procedimento para o ressarcimento do ICMS devido por Substituição Tributária, em virtude do decidido pelo E. STF, no RE nº 594.843, uma vez que cada Estado tem adotado sistemática específica
Fonte: Revista ABAAS nº 9 | Outubro de 2019
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